segunda-feira, 2 de março de 2015

VELHAS GAVETAS

De volta aos meus arquivos empoeirados, descobri alguns trabalhos que foram motivo de grande reflexão na minha produção pictórica dos anos 90. 
Equivocadamente, muito se discute o que é pintura e o que é ilustração nos dias de hoje. Em linhas básicas, ilustração seria tudo aquilo atrelado a um tema, ao conteúdo narrativo, àquilo que pode ser contado como história. Pintura, como dizem os estetas é tudo o que contém uma plasticidade própria, com a prioridade absoluta na forma, nas cores e tons per si, sem nenhum compromisso com o fator narrativo. Ora, isto é um conceito que se estende como uma fina camada de verniz, algo bem superficial. Assim, o que dizer dos mestres da pintura histórica? Grandes artistas do século dezenove, que se dedicaram aos temas de época, os pintores pompier, foram venerados por toda a sociedade europeia daquele tempo. Diga-se de passagem, os rumos da ilustração profissional nem estavam traçados ainda, portanto, o que esses mestres faziam era ilustração? Quanta besteira... O gênero pintura histórica foi o mais respeitado e valorizado em todas as épocas.
Essa bobagem, postulada no século vinte, foi o meio encontrado pelos modernistas para destruir os pilares da grande arte e da herança renascentista. Quanto a mim, ainda estudante de arte, deixei-me influenciar com a empulhação imposta pela crítica, pois os cultores do caminho fácil rotulam tudo de ilustração. E se for ilustração? O que requer do artista mais talento, skill e percepção – um quadro de Kandinsky ou uma ilustração de Harold Foster? Bem, com todo respeito a Kandinsky, meu abstracionista preferido, em relação aos borradores de telas de hoje, depois que termino meus quadros figurativos, faço belos abstratos com os restos de tinta que sobram na própria paleta... Depois, limpo tudo com querozene.
Como tanto falei, venho de uma formação artística na Old school, mas, devido aos caminhos profissionais que percorri nas agências de publicidade, recebi influência direta dos designers e ilustradores americanos da década de 70, em especial, o Push Pin Studios. Ora, esses ilustradores eram descendentes diretos dos pintores dadaístas e surrealistas europeus. Magritte, Klee, de Chirico e outros. Não havia como refutar coisas tão fantásticas dos anos dourados. Vi-me, então, em conflito, pois detestava o surrealismo barato e apelativo, mas amava a projeção de ideias inteligentes através da visão dos ilustradores modernos - era uma recontextualização do surrealismo.
Além dessa experiência de nuance estilística, reforçada através de publicações geniais como Graphis; Modern Publicity; Idea; Illustrator’s; Communication arts e outras conheci Oscar Palacios, que muito me incentivava com as experiências oníricas na pintura. Embora não me identificasse com o mundo daliniano, voltei-me, então, para algo que imaginava ter mais conteúdo. Busquei uma vertente acadêmica em que pudesse prosseguir com o exercício do desenho clássico e das cores da natureza. Algo clássico na forma e moderno no tema.
Então, mesmo ao atravessar o deserto das dúvidas estéticas, continuei com a contumácia e prossegui nas pesquisas em busca de um realismo neometafísico. No início dos anos 90, interessei-me por Martin Heiddeger – leituras e releituras que fiz do Ser e tempo, embora repudie a sua vida, o envolvimento com o nazismo e a covardia que praticou com Hannah Arendt. Mas, pelo filósofo que foi, a sociedade esqueceu o lado humano sinistro de Heiddeger. Adiante, estudei O ser-tempo, de André Comte-Sponville. Ainda, na época, com os meus questionamentos da temporalidade, as divagações sobre a morte e o sofrimento humano, decidi traduzir essas convulsões do espírito através de pinceladas. Assim, insisti nas experiências pictóricas em busca de um conteúdo ontológico, exteriorizando a visão caótica e metafísica do mundo através da pintura.
Estes quatro trabalhos, dos anos 90, demonstram  minha intenção em ficar distante das banalidades dalinianas e o objetivo de recontextualizar o surrealismo. Com mais conhecimento de desenho, expressão metafísica, mais individualizado, com carga simbólica evidente e vinculado aos parâmetros clássicos.

Na próxima postagem, faço a conclusão.

"Em busca do tempo perdido I" - OST - 1995

"Em busca do tempo perdido II" - OST - 1995

"Em busca do tempo perdido III" - OST - 1995
"Em busca do tempo perdido IV" - OST - 2009




segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

SOBRE AQUARELA

    A tese que sustento pode escandalizar alguns: John Gannam, mestre ilustrador da Golden age especializou-se em aquarela e - pasmem -, nesse gênero não ficou devendo nada a John Singer Sargent... É isso mesmo. Para o aquarelista, o desenho é a chave de tudo e Gannam ostentava a "facilidade" que só encontramos em Sargent, Tiepolo, Van Dyck e Velázquez. Entretanto, as pessoas não conseguem identificar a grandiosidade de um artista olhando a sua obra, mas ficam à mercê dos textos, dos nomes famosos. Mas o processo é tão simples, que chega a ser um tanto estúpido - é só confiar nos olhos! Acredite no que vê, não no que dizem. 
  Falo aqui sobre fluidez dos meios aquosos - skill, craft, draftsmanship com extremo abuso dos termos em si. É a essa facilidade que me refiro. Não adianta querer buscá-la a vida toda, ela vem ou não. Veja-se o caso de Antonio Salieri e Mozart... Pior que certas coisas têm preço. Mozart foi enterrado como indigente, enquanto Salieri esnobou na côrte. 
    Mister Gannam, era o jeito que o chamavam, teve como seu grande incentivador Frederick Remington, o maior pintor do Oeste americano. Antes do surgimento da era do guache na ilustração americana, a aquarela ainda se mantinha como técnica preferida dos grandes mestres. É no mínimo curioso como as pessoas têm medo da excomunhão intelectual por aqueles que ditam princípios tolos. No passado, a Igreja encomedava arte a Michelangelo, Rafaello e a dezenas de outros mestres. A realeza também encomendava arte a Rubens, Velázquez e a dezenas de outros gênios. Agora, se nos tempos modernos uma editora encomenda arte a John Gannam, talvez seja porque ele não passa de um simples ilustrador... Por acaso, o traço, os tons e as cores desse grande aquarelista não se nivelam às obras dos mestres do passado? Eles também não adotaram um tipo de make a living com aquilo que sabiam fazer melhor? Será que os críticos hipócritas, antes de acusar Gannam, pagariam as suas contas? 


  














John Gannam e suas xícaras de café...

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

E O NETINHO CHEGOU...

Este é o Matheus, que veio nos renovar!


Com a mamãe e o pai deixando a clínica...


quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Antes de mais esta postagem, gostaria de homenagear meu filho mais velho, Daniel, que se tornou MASTER OF BUSINESS ADMINISTRATION esta semana... E meu outro filho, Sérgio Donatello, que vai me dar um neto em poucos dias!


LOVELL



Tom Lovell

      Hoje, mais uma vez, lembrei-me de Tom Lovell, um dos grandes mestres da época de ouro da ilustração americana. Não posso negar a influência que tive do seu trabalho, pois acho que só recebemos influência das coisas que admiramos de fato. No meu ponto de vista, ele ultrapassou a fronteira da ilustração comercial, tornando-se um fine-illustrator no sentido que a palavra expressa. Na verdade, um grande pintor.
    A paixão de Tom Lovell pela História e a devoção à pesquisa iconográfica acurada é refletida na sua arte, enriquecendo-a. Lovell nasceu em Nova York em fevereiro de 1909. Quando era menino, costumava visitar o Museu de História Natural com sua mãe, onde passava horas fazendo dezenas de esboços das relíquias expostas. Na medida em que crescia, procurava trabalhos relacionados aos seus objetivos artísticos, até que, finalmente, ingressou no College of Fine Art da Universidade de Syracuse. Enquanto se dedicava aos estudos básicos de arte, começou a trabalhar como ilustrador para as revistas populares da época. Então, em 1931, bacharelou-se em Fine Arts pela Syracuse University.





    Lovell considerava-se um sortudo por ganhar sete vezes mais por uma ilustração do que o autor do próprio texto publicado, numa época em que o país atravessava sérios problemas econômicos. Em 1937, suas ilustrações estavam presentes nas mais importantes revistas americanas: National Geographic, Life, Time, Cosmopolitan, Ladies Home Journal, Woman’s Home Companion, Colliers, McCall’s e outras, ilustrando as obras dos escritores mais renomados do planeta.




    Em 1944, Lovell alistou-se na Marinha americana como fuzileiro e artista combatente. Mas serviu por dois anos como staff artist, dando início de fato ao que sempre buscara: a pintura histórica. Como não conseguira, naqueles tempos, dedicar-se por completo ao seu objetivo, prosseguiu na produção de ilustrações de temática variada por quase quarenta anos, mantendo os temas de época um pouco à parte.





    Na década de setenta, entretanto, Lovell mudou-se com a família de Connecticut para Santa Fé, Novo México, e passou a se dedicar inteiramente ao seu primeiro amor artístico – o já mencionado gênero histórico –, mas com ênfase na especialização de cenas do Oeste americano. Assim, Tom Lovell se expressou sobre a sua arte: “Sempre estive interessado nos índios americanos desde os meus nove anos... Esse interesse jamais me abandonou, embora eu já utilizasse esses temas no meu trabalho anterior. Quando me mudei para o Oeste, todo meu interesse e conhecimento do assunto parecia estagnado. Mas, embora eu não tivesse interesse em assumir a identidade de um cowboy, percebi que o Oeste tinha muito mais coisas importantes do que ser um vaqueiro. Existem muitos artistas que conhecem a vida do Oeste atual a fundo e provam isso nos seus quadros. Mas, no meu caso, existe a preocupação de historiador, de voltar no tempo e isto é o que faço”.




    A imaginação de Lovell, sua habilidade de pesquisa, junto com o talento e domínio técnico, concorriam perfeitamente para a narrativa histórica. Os temas abordados por Lovell vão da Antiguidade aos dias de hoje. Ao longo da sua carreira, Lovell recebeu muitos louvores e condecorações. Ingressou na Society of Illustrators Hall of Fame; suas pinturas foram adquiridas pela Casa Branca; pela U.S. Maritime Academy; pelo New Britain Museum; pelo Marine Corps Headquarters; National Geographic Society; National Cowboy; Western Heritage Museum; Abel-Hanger Foundation; dezenas de galerias de arte e escritórios famosos, fazendo parte das coleções particulares mais importantes do mundo.





    Em 29 de junho de 1997, Lovell faleceu num acidente de carro, aos 88 anos. Certa vez, já perto do fim, disse: “Sou um homem de sorte. Pintei por mais de cinquenta anos e realizei meus sonhos”... Sua vida foi bem empregada, fazendo o que mais amava. Ilustrando o presente e o passado – a vida e a História para o deleite dos homens. Tom Lovell criou escola... E grande arte.



































Alguns esboços preliminares: